Por que o Brasil precisa investir mais em Educação?
O país tem uma dívida histórica com seu sistema educacional. Para saná-la, são necessários muito dinheiro e boa gestão
Três correntes se enfrentam nessa discussão: além dos defensores do investimento equivalente a 10% do Produto Interno Bruto (PIB) - proposta aprovada na Câmara dos Deputados, em discussão no Senado até o fechamento desta edição -, há aqueles que trabalham por um percentual menor, entre 7 e 8%, e uma terceira vertente que afirma ser desnecessário ampliar o valor atual.
O principal argumento desse último setor se apoia em uma conclusão equivocada, obtida com base em dados verdadeiros. Atualmente, o Brasil e a Coreia do Sul investem praticamente o mesmo percentual do PIB em Educação (4,97 e 4,63%, respectivamente, segundo dados do IMD World Competitiveness Yearbook 2012). Apesar disso, o país asiático figura entre os mais bem colocados nos rankings do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), enquanto nós ocupamos a amarga 53ª posição. Surge, então, a pergunta: se investimos o mesmo, por que apresentamos resultados tão diferentes?
A melhor maneira de responder a essa questão é desfazer uma confusão de conceitos econômicos presentes na comparação: Brasil e Coreia não investem o mesmo. Utiliza-se o percentual do PIB como referência para obter a dimensão do esforço que cada país faz para garantir um ensino de qualidade.
Contudo, essa informação não pode ser a base para contrapor diferentes países, pois desconsidera particularidades importantes. Por exemplo: se dividirmos os PIBs da Coreia do Sul e do Brasil pelo número de habitantes de cada país, o valor per capita obtido será de 32,4 mil dólares anuais para os coreanos e 12 mil para os brasileiros.
Com base nessa ideia, o relatório Education at a Glance, da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), propõe uma análise mais justa. Segundo o documento, o Brasil gasta, em média, 2.647 dólares por aluno por ano (incluindo Educação Básica e Superior). Na Coreia do Sul, o valor é mais de três vezes maior: 8.542 dólares (veja o gráfico abaixo).
Investimento por aluno
Recursos gastos por ano com cada estudante da Educação Básica à Superior*
Fonte OCDE. * Em dólares PPP (poder de paridade de compra), fator de conversão que leva em conta o poder de compra da moeda em cada país e não apenas a taxa de câmbio entre as diferentes moedas.
Essa dívida se traduz no fato de que apenas 35,5% da população brasileira tem 11 anos ou mais de estudo - período equivalente ao Ensino Fundamental e ao Médio - e que 16% dos jovens entre 15 e 17 anos não frequentam a escola, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2011. Isso sem contar o enorme déficit no atendimento da Educação Infantil. Incluir todos no sistema educacional demanda dinheiro. Construir escolas, instalar quadras, laboratórios de informática e bibliotecas, ampliar o sistema de transporte escolar, aumentar a grade docente são apenas alguns dos gastos que teremos nos próximos anos.
Apesar das diferenças, é possível usar a Coreia do Sul como exemplo do que ainda é preciso fazer. Na década de 1970, o país investiu pesado na instrução de seu povo, o que possibilitou uma garantia de estabilidade para o desenvolvimento econômico. O livro South Korea in the Fast Lane (Young-Iob Chung, 480 págs., Oxford University Press, oxfordscholarship.com, 20,93 dólares, sem tradução para o português) mostra que o país chegou a gastar, em 1973, 9% do seu PIB em Educação. Com os atrasos superados, a Educação consolidada e uma economia forte, esse percentual pôde ser reduzido gradativamente.
É fácil entender o porquê disso. Construir infraestrutura e educar um batalhão de jovens e adultos que não puderam frequentar escolas na idade correta são gastos temporários, que diminuem com o passar dos anos. A população brasileira está ficando mais velha e o número de crianças e jovens em idade escolar será menor no futuro, permitindo que o investimento por aluno aumente. É o chamado bônus demográfico.
Alguns gastos, entretanto, precisam ser colocados no planejamento de longo prazo, principalmente os relacionados ao pagamento dos professores. O Brasil tem de abrir a carteira e garantir, além do cumprimento da Lei do Piso, planos de carreira que incluam o aumento na remuneração média dos profissionais da Educação. Também é necessário contratar mais docentes e criar programas consistentes de formação continuada para quem já está na ativa.
O Ensino Superior, que não é nada barato aos cofres públicos (cada aluno custa, por ano, 11.740 dólares), é outro segmento que carece de investimentos em larga escala. Além de facilitar o acesso a esse nível educacional e estabelecer políticas que garantam a permanência dos estudantes na universidade, é urgente a necessidade de expandir a rede pública sem permitir que haja queda na qualidade. A mais positiva consequência dessas ações é a melhora na formação inicial dos professores da Educação Básica.
Diante desses fatos, fica claro que precisamos de um aumento expressivo na quantidade de recursos destinados à Educação. Cabe ao governo colocar a área como prioritária e estudar alternativas para ampliar o investimento, garantindo mecanismos legais capazes de aumentar o percentual repassado às redes públicas, sem onerar a população, em especial, os mais pobres.
Vale lembrar, por fim, que o dinheiro por si só não é capaz de resolver de forma mágica nenhum dos problemas de nosso ensino. Para que isso aconteça, é preciso garantir a boa gestão do investimento. No mês em que se comemora o Dia da Educação (28 de abril), é importante lembrar que pais, alunos, professores e o poder público têm a obrigação de acompanhar a aplicação dos recursos e fiscalizar as contas para garantir que o dinheiro vá para as áreas de maior prioridade
Publicado em NOVA ESCOLA Edição 261, ABRIL 2013.